sexta-feira, 24 de setembro de 2010

The Raven Song - Capítulo 4

Ok, depois de ler, reler, reescrever e tomar alguns "esporros" básicos da minha beta (*pigarro* né, Samila?), finalmente esse capítulo ficou "apresentável".

O que não quer dizer que ele me deixe menos revoltado, irritado e/ou envergonhado. Provavelmente ninguém vai entender porque, mas enfim... Ninguém quer saber disso mesmo, então vamos logo ao capítulo!

Mas antes, um último recado:

Não vou dizer que isso aqui não é recomendável para menores de 18 anos, porque sei que a maioria que lê isso não tem nem a pau 18 anos - nem EU tenho! -, mas é bom de qualquer jeito ficarem avisados que haverão cenas de estupro e sexo EXPLÍCITAS nesse capítulo, então não quero nenhum bebê chorão reclamando que o "tio Sara Pervo" não disse nada e acabou com a inocência de alguém! Desde já fica o seguinte: Se você leu, foi porque quis... e também porque essa história é boa demais pra não ler! XDDD /apanha



Capítulo IV: A Morte de Deus (ou “Demônios que Derretem”)

— O que você faria — começou a mulher, analisando-o por inteiro enquanto caminhava ao redor da plataforma de metal na qual ele encontrava-se ajoelhado e firmemente preso, uma focinheira impedindo-o de mover o maxilar — para salvá-lo, Sr. Raven?

Os olhos verdes do homem se desviaram dela e encararam o chão, pensativos.

///

Você nasce. Sua mãe tenta te matar antes mesmo que você grite como qualquer bebê. Ela não consegue — sempre foi uma inútil. Então, te manda para a família do seu pai retardado mentalmente. Aqueles lá te dão pro orfanato. No exato momento em que você aprende a andar com suas pernas magricelas (mais ou menos com um ano e meio), foge do lugar sem olhar pra trás. Você aprende a se virar sozinho e aprende também que não existem as pessoas legais que aparecem sempre nos desenhos animados que as crianças ricas, felizes e que tem pais, assistem no sábado de manhã. Você aprende a degolar sem sujar as mangas da camisa e como roubar um relógio sem que ninguém perceba — pelo menos a temporada com o mágico e seu baralho de cartas vagabundas deu-lhe alguma habilidade promissora com as mãos.

A única coisa na qual você parece ser bom é em destruir.

Destruir, destruir, destruir...

Você é o rei da destruição, o rei da dor.

Sabe ler e escrever, mas nunca foi pra uma escola de verdade. Também sabe tocar um pouco de violino, mas que diferença isso faz na hora de procurar um emprego?

Você é — socialmente — considerado tão imbecil quanto o seu pai mongol.

Você é tão “inútil” quanto um preto na hora do trabalho.

Você provoca tanto asco nas pessoas quanto a visão de um veado beijando outro.

E, rá, é bom você aprender a disfarçar sua revolta atrás dessa brilhante máscara que chama-se “ironia”, pois adivinhe só? Você não pode morrer!

Sim, isso mesmo, você é aquilo que os cientistas chamam de “milagre” e o que os crentes cospem como “aberração”. Vai se acostumando, amigo... Porque as coisas vão ser sempre assim pra você.

Ou talvez não.

Porque existe um par de olhos negros nessa porra de mundo que não te olha como se fosse lixo. Eles não te julgam, não te recriminam. Eles não sentem pena de você (e provavelmente esse é o ponto mais importante e que mais te agrada). Esse par de olhos diz, silenciosamente, enquanto seu pai está com o crânio esmagado, sangue escorrendo na direção de seus sapatos desgastados e a mãe com as pernas arreganhadas exibi-lhe a boceta espanhola: “Eu entendo você”.

Como não amar esses olhos? Como não desejar que eles jamais vejam o mesmo que você?

Você então passa a cuidar desse pequeno indivíduo de olhos negros. Tenta torná-lo uma “pessoa de bem”, mas você mesmo não é uma pessoa de bem, então como? A questão é sempre o “como”...

Esforce-se. Persista. Observa as mães no parquinho, às escondidas, como um pedófilo admirando seus objetos de adoração. Elas amam os filhos, são cuidadosas. Elas os protegem. Então é assim que você tem de ser! Pode parecer estranho a princípio que você aja como uma mãe, mas os pais sempre parecem tão ocupados para lidar com seus filhos...

A realidade, meu caro, é que você ama essa criança. Ela é a única coisa que resta de bom em você. Você não é o pai dela, nem biologicamente ou espiritualmente. Você jamais chegaria tão longe a ponto de afirmar tal ou pedir pra que esse pequeno indivíduo de olhos negros confirme um parentesco inexistente — além de indesejado. Pois você, em momento algum, desejaria que essa criança tivesse algo seu. Ela é perfeita justamente porque é o contrário de você, porque nada nela traz a mais remota lembrança de sua perturbadora pessoa. Seu oposto, um pólo positivo.

Uma luz num reino de trevas.

Sua salvação.

Seu Deus.

Mas o que acontece... quando você percebe que se deu a um luxo para o qual nenhum demônio nasceu?

Quando você percebe que cometeu o pior erro de toda a sua existência, o crime cuja punição é a mais perversa em todo o Universo.

Você sonhou.

Ah, seu grande merda, você sonhou!

///

Os dois se agarravam, corpos roçando-se de forma selvagem e línguas travando uma batalha sem vencedor ou perdedor. O homem de olhos claros jogou-se em cima do hispânico, arrancando-lhe a camisa e acariciando os músculos de seu peito bem trabalhado e já com algumas cicatrizes.

— Hoje é o seu aniversário e eu tenho um presentinho pra você... — ele dizia já abrindo a calça, exibindo melhor o volume entre suas pernas.

Sai de cima dele — ordenou calmamente uma voz espectral.

O homem olhou por cima do ombro e deu de cara com um sujeito recostado relaxadamente na porta fechada, encarando-o com a expressão mais entediada do planeta.

— Ei, cara, não vem com essa! Estou atendendo um cliente e é melhor você cair fora daqui ou...

Antes que pudesse concluir suas ameaças vazias, ele foi tirado da cama e jogado com violência no chão. Logo, percebia que um canivete na ponta da bota do estranho pressionava-lhe perigosamente o membro desperto.

Melhor cair fora ou eu arranco seu ganha-pão, veado.

Rapidamente, o homem arrastou-se até a porta implorando desculpas e sumiu, deixando-a entreaberta ao sair.

E então — Raven voltou-se para um Giovanni envergonhado e ofegante — o que raios pensa que está fazendo aqui?

— Estou comemorando o meu aniversário de 18 anos. O que te parece? — resmungou sem encará-lo.

Me parece que você estava prestes a dar a bunda praquele merdinha.

— Eu estava mesmo. Algum problema com isso?

Raven inclinou a cabeça lentamente, fitando o rosto corado do melhor amigo. A tonalidade dos seus olhos beirava o branco e as pupilas encontravam-se encolhidas ao máximo, quase desaparecendo.

Não tenho nada a ver com essa parte da sua vida. Por mim você pode fazer o que quiser com o seu traseiro. Mas procurar garotos de programa?! Isso não faz o seu estilo.

— Como se você soubesse qual é o meu estilo!

Ele deu uma risada debochada, ainda encarando o rapaz com os olhos fixos.

Eu te conheço melhor que você mesmo. E não foi essa a educação que eu te dei.

— Você fala como se fosse meu pai... — o hispânico escondeu a ereção com um travesseiro e tomou coragem, devolvendo o olhar intenso que Raven lhe direcionava — Você não é o meu pai.

Eu nunca disse que era. — ele piscou e seus olhos começavam a ficar um pouco mais normais. Seus dedos acariciaram a têmpora esquerda dele — O que está havendo com você, baixinho? Anda tão estranho nos últimos dias...

— É que... — as defesas caíram. Segurando a mão de Raven em seu rosto, ele não disse mais nada.

O homem pálido começou a ficar preocupado.

Giovanni... O que está acontecendo?

— Nada, Rae-Rae.

E aquele agradável rapaz que saiu daqui era o Mickey Mouse e esse lugar é a Disneylândia!

— Por que você não para de insistir?! Eu não quero falar sobre isso, ok?!?

Antes que pudesse correr dali, o jovem foi agarrado pela nuca e Raven aproximou-se perigosamente de seu rosto. Ele estremeceu, lembrando-se que o mais velho fizera a mesma coisa com sua recente vítima — uma adolescente de aproximadamente 16 anos, grávida, amante de um cretino cuja empresa servia para lavagem de dinheiro e que andava chantageando um político influente. Havia aberto a barriga dela e puxado as tripas pra fora, escrevendo com elas uma mensagem para o sujeito, dizendo-lhe que se continuasse a importunar o “Sr. X”, coisas muito piores aconteceriam com a esposa dele e seus dois filhos pequenos...

Bem, era uma grana boa e um trabalho simples. Não o culpe.

Eu só estou preocupado com você.

— Rae-Rae... eu...

Me conte. Sou ou não sou seu amigo?

— Eu tenho medo, Rae-Rae.

Apenas uma respiração soava no quarto. A outra encontrava-se presa pela metade no peito do Nevasca. Giovanni sentia a mão tão gelada quanto a de um cadáver em seu rosto, e acredite, ele sabia muito bem como era uma, afinal já havia carregado muitos deles, mais vezes do que gostaria...

Tem medo de mim, Giovanni?

— Não. Eu tenho medo que você me odeie.

Eu jamais te odiaria. Pare de dizer merda.

— Se é assim, só me resta... — ele interrompeu-se ao colar os lábios de ambos. Podia sentir o gosto da boca de Raven: era uma mistura estranha de nicotina com naftalina, que teria enojado-o se não tivesse comido coisas da rua que tinham gostos muito piores. O que o afastou realmente foi o fato do homem não mover um único músculo durante o beijo.

Quando seu rosto estava longe do dele, Raven virou lentamente a cabeça para o lado, deixando que seus cabelos cor de piche escondessem seu semblante indiferente.

— Rae-Rae...?

Silêncio.

— Rae-Rae...? Sinto... sinto muito.

Silêncio.

— Por favor, diga al...

Há quanto tempo — pronunciava pausadamente cada palavra, o tom de voz vazio — você sente-se assim em relação a mim?

— Já tem algum tempo — admitiu.

Quanto?

— Eu não sei...

Foi desde aquele dia do cafetão, não foi?

— Não.

— Foi antes então?

— Eu não me lembro!

Quando te salvei? Foi esse o dia?

— Não... foi quando você — seus olhos arderam — disse que me amava.

Lembro disso. Foi algum tempo depois de eu te salvar. Um moleque. O que pode saber sobre esse tipo de sentimento?

— E o que você sabe sobre amor, hein?!?

Quer ser meu amante?

O silêncio ergueu seu manto mais uma vez.

— O qu...?

Quer transar comigo? Ficar por cima de mim? Ou seria por baixo? Hm, penso na segunda opção, você sempre teve jeito de mulherzinha. Aquele ar gentil, delicado... — o olhar verde-nadja era cruel.

— Raven do que você está...?

Antes que pudesse concluir a frase, o homem pulou em seu corpo com violência, segurando-lhe o pescoço enquanto ficava no meio de suas pernas. Os cabelos ainda caíam em seu rosto, deixando à mostra pedaços cortados de seus olhos arregalados e de aparência psicótica.

Quer que eu coma você, bicha? Que eu te enrabe? É isso o que você sempre quis, não é mesmo?! Me enganou todo esse tempo... Quando eu dava banho em você, te abraçava, dormia do seu lado por causa dos malditos pesadelos, tudo, TUDO! Tudo foi um plano seu, não é mesmo? Me manipulou, aproveitou-se dos meus sentimentos... Seu veado miserável!

— R-Raven... Nã-não...

Uma ardência estranha o fazia piscar incontrolavelmente. Viu alguma coisa molhada cair no rosto moreno do rapaz abaixo de si e o primeiro pensamento que lhe ocorreu foi: “Estou derretendo. Maldição, meus olhos estão derretendo, eles vão cair da minha cara! Aahh, merda!”.

Eu amei você! E você me traiu, seu maldito! Está... merda!... isso está me matando. Você está me matando! Eu vou... acabar com você... antes que me mate. Vou...

As mãos desprovidas de cor moveram-se, arrebentando a fivela do cinto que Giovanni usava. Ele o virou de costas na cama, empinando sua cintura com brutalidade. Arrancou a calça dele, um ofegar animal escapando de seus lábios.

Naquele momento, ele não era um homem.

Você me quer? Vou te mostrar o que acontece com quem me quer...

Abaixou as próprias calças.

Penetrou-o sem piedade até o fim.

Ouviu-se um princípio de grito escapar dos lábios do jovem, mas sua boca foi coberta com o braço de Raven. Sentiu o gosto amargo do couro que constituía o casaco pesado que ele sempre usava e lágrimas rolaram por seu rosto, assim como acontecia com o mais velho (“estou derretendo... merda, estou derretendo!”).

E foi assim durante longos minutos.

A cama tremia, batendo de encontro à parede em cada estocada dolorosa.

Dolorosa para ambas as partes. Era um ato de ódio entre pessoas que se amavam. Um ato de medo, de covardia. Um ato que visava mostrar o segredo que sempre estivera à mostra...

Os demônios são apenas isso: demônios.

Gozou. Seu sêmen escorreu pelas coxas do homem quando separaram-se e enquanto guardava o pênis flácido dentro da calça, evitou encarar o corpo suado e fraco jogado naquela cama de lençóis baratos.

Raven ainda sentia seus olhos “derretendo”.

Foi tudo um erro. Desde o começo. Eu devia ter matado você junto com aqueles mendigos. Você... seu cretino, você me deu esperança! Mas olhe o que se tornou no final... Você mentiu.

— Não... — a voz saía num sussurro exausto. Giovanni sentia todo o seu corpo rugir de dor. Sentia como se tivessem aberto-o lentamente por dentro com um facão. Sentia-se rasgado em dois. — Eu nunca te enganei. Eu amo você...

Seu imbecil! — agarrou-lhe chumaços do cabelo negro e puxou a cabeça para cima, encarando-o com os dentes amarelados à mostra — Eu abusei do seu corpo. Como ainda pode me amar?! Seu... seu...

Socou-lhe o rosto até sangue escorrer por seu nariz e apenas parou quando teve a impressão de que o mataria.

Eu te odeio.

— Eu te amo. — sussurrou debilmente o rapaz, quase desmaiando. A morte para ele seria ótima naquele instante, quando todo o seu corpo doía. Até mesmo sua alma gritava, sangrando. — Eu te amo!

Isso é doentio. Pare de repetir! Ou vou fazer aquilo de novo! Vou fazer até você se convencer de que nunca vai ter mais nada de mim além da dor e do sofrimento! Crie amor-próprio.

— Pode me estuprar o quanto quiser. Não faz diferença. E essa porra de “amor-próprio”... não passa de um nome mais bonitinho para “auto-piedade”.

Não seja teimoso. Por favor, Giovanni.

— Raven, me desculpe por ser assim. Mas não vou mudar... — e aqui, engasgou-se com um pouco de sangue que descia por sua garganta — Eu amo você de verdade. Me deixe te ensinar a amar, Rae-Rae. Me deixe cuidar de você...

Um sorriso amargo surgiu nos lábios finos e de gosto tóxico.

“Cuidar de mim”? Não. Eu não preciso de proteção. Não preciso do que você tem a me oferecer. Só não te mato agora porque não vale a pena perder meu tempo com um traidor medíocre.

— Como você pode ser tão cego, Raven? Como pode ser tão estúpido?!

Não sou eu quem depois de ser estuprado ainda tem coragem de dizer para o agressor que o ama...

— O amor perdoa, Raven. Ele...

Blábláblá! Amor, amor, amor! AMOR?! Vá para o inferno com o seu “amor”! O amor é como Deus: Dizem que ele salva, que nos torna bons, mas veja o que o “amor” fez com o mundo, garoto! Acha que mulheres negras terem ratos vivos enfiados na vagina é um “ato de amor”?! Acha que crianças debiloides serem violentadas por cães treinados especialmente para isso pelos militares é um “ato de amor”?! Acha que... uma mãe tentar matar o próprio filho é um “ato de amor”?! Se isso é o “amor”, eu prefiro o ódio; pelo menos ele não é dissimulado, não engana, não dá falsas esperanças. E se o ódio não te agrada, então pegue a indiferença, feche sua boca e finja que não vê o quanto essa porra de mundo está fodida, pois é exatamente isso que as autoridades fazem! É o que o “grande e maravilhoso” Deus faz, ou faria, se Ele também não passasse de uma mentira! O “amor” é uma mentira tão grande quanto Deus! E eu... estou cansado de tantas mentiras.

Raven deu as costas para o jovem e abriu a porta, arrancando pelo corredor sem dar atenção para vários rapazes e moças semi-nus que o encaravam silenciosos. Ele descia as escadas rapidamente, pulando o último lance de degraus assim como um mendigo de pau imundo que encontrava-se jogado ali, talvez morto ou apenas bêbado.

O Nevasca saiu do prédio e andou. Andou, andou, andou. Andou até parar próximo da floresta. Estava frio e ele sentia o ar gelado atingir seu rosto molhado furiosamente.

Ele deixou-se cair de joelhos e vomitou.

A culpa é sua. É toda sua, seu babaca.

Não foi bom o suficiente. Não conseguiu criá-lo da forma correta. Não é seu filho, jamais seria, mas... você não o criou da mesma forma que um pai (ou uma mãe, tanto faz!)? Não o protegeu, o educou, o alimentou? Não o amou antes do seu imenso ego? Por que então ser castigado dessa forma? Por que ser traído desse jeito? O que você fez para merecer tal tratamento? Por que...?

A criança de olhos negros que você amou e protegeu, diz que te ama. Te ama como homem. Sente atração pelo seu horrível corpo deformado. Deseja beijá-lo como um tolo apaixonado faz. Isso é apenas a prova concreta de que você é um fracasso. Um completo fracasso. Não é certo. Isso é... é... é...

Pare de choramingar, seu bostinha.

Isso não vai fazer com que seu destino seja diferente.

Vomitou. E de novo. De novo. Até não haver mais nada em seu estômago, apenas a sensação estranha de bílis na boca. Limpou o queixo com as costas das mãos, mas não levantou-se.

Você tentou, parceiro.

Seu estigma sempre será tentar dar o melhor de si para sua criança, sabendo que jamais vai conseguir alcançar seu máximo.

Porque os demônios não foram feitos para esse tipo de coisa.

Aceite os fatos.

Não se sentirá melhor em nada, mas pelo menos não seja hipócrita como os outros...

///

A focinheira caiu no chão com um som seco quando Moskov girou a chave no cadeado, deixando-a escorregar pelo maxilar do homem.

— Eu... faria qualquer coisa. — foi a resposta que a Tenente teve.

A mulher sorriu.

— Está fazendo uma ótima escolha, Sr. Raven! Agora, vamos discutir seu trabalho...

Estou pensando no bem da minha criança. Afinal de contas...

///

Raven sentiu uma mão pousar em seu ombro. Ele não ergueu a cabeça. Permanecia ajoelhado, sentindo os joelhos começarem lentamente a congelar.

— Vamos sair daqui, Rae-Rae — disse com calma a voz acima dele.

Ele levantou-se.

Não sabia muito bem como havia parado no quarto daquele prostíbulo mais uma vez, só retomou consciência do que acontecia ao seu redor quando notou que seus pés estavam enfiados em uma bacia com água quente enquanto Giovanni o envolvia cuidadosamente com uma manta. O nariz dele encontrava-se torto e o rosto meio inchado do lado direito. Um olho roxo.

— Não devia ficar desse jeito no frio. Pode acabar morrendo.

///

...eu o amo, senhoras e senhores.

Riam, debochem, apontem.

Façam isso, eu sei que mereço.

Mas eu o amo, o que posso fazer?

Como não amar aquele par de olhos negros que conseguem fazer a vida parecer boa?

///

Se eu morresse, tudo seria melhor.

— Não diga algo assim, Rae-Rae.

Ele estava debruçado, secando carinhosamente seus pés. Raven não disse mais nada.

Puxou-o para a cama, deitando-o nela.

Giovanni sentiu quando ele começou a abrir sua calça e de repente imaginou a cena de seu corpo sendo violado mais uma vez. Fechou os olhos, antecipando a dor que viria em seguida.

Mas Raven apenas beijou-o na testa e pôs algo em sua mão. Um canivete. Então levou o punho fechado do rapaz que empunhava a lâmina até seu pomo-de-adão.

Recobre sua honra. Corte.

Os olhos do rapaz se arregalaram, mas ele não conseguiu afastar a lâmina meio enferrujada da pele pálida do outro. Podia ver com perfeição a jugular pulsando.

Não se preocupe: se você cortar vai interromper o fluxo de sangue para o cérebro e eu vou morrer bem rápido... ao menos mais rápido do que se fosse cortando em outro lugar. Enfiando bem fundo o canivete, você vai danificar minhas cordas vocais e nem vai me ouvir gritar. Vamos, faça. Juro que não vai ser doloroso pra mim.

A mão do jovem tremia, mesmo que Raven a segurasse. Usando toda a sua força, ele apontou a arma na direção do próprio pescoço.

— A única garganta que vai ser cortada se você continuar falando isso vai ser a minha. Então pare agora mesmo. — disse com firmeza.

Você tem certeza disso?

— Sim.

Então... vai ter de me perdoar.

Suas calças foram arrancadas.

Um dejá vù, senhoras e senhores...

Entretanto, foi Raven quem se despiu lentamente, exibindo o corpo delgado e pálido demais para ser agradável olhá-lo, com algumas sardas espalhadas pelos ombros e cicatrizes que se assemelhavam a marcas deixadas por garras, próximas do umbigo.

Ele apoiou-se com as mãos espalmadas no peito do mais novo e com uma careta de dor, deixou-o penetrar seu corpo com extrema dificuldade. Pois doía. Doía como o inferno aquela droga!

Suas unhas longas acabaram arranhando um pouco a pele de Giovanni, mas este não parecia se importar, tão imerso no paraíso encontrava-se.

“Ah... quente”, era a única coisa em que pensava. “E apertado pra caralho...” O corpo de Raven, sempre tão frio e às vezes escorregadio como o de um réptil agora suava e aquecia-se, assumindo temperatura e textura deveras agradável.

— Rae-Rae... é... é tão bom.

Você acha? — os lábios finos contorceram-se numa careta novamente e ele aproximou seu rosto ao do rapaz — Isso se chama “pecado”. Já ouviu falar?

— Não, isso é... amor! — agora ofegava rapidamente, agarrando a cintura reta do homem, aumentando a velocidade com que ele se movia sobre seu corpo. — Te quero tanto, Raven... Tanto!

E conseguiu mudar de posição, ficando por cima do corpo maior que o protegera durante toda a vida. Aquele corpo que o encantava, que passara a ser sua principal fonte de sonhos eróticos durante a adolescência...

— Tão... lindo! — falava fascinado, deslumbrado, apaixonado. E por fim, quando o momento estava cada vez mais próximo, enterrou-se até o fundo e deixou seus lábios roçarem suavemente na boca mortífera do Nevasca, chegando mais próximo de um beijo do que jamais teria em toda a sua vida.

Vou parar no Inferno depois disso — Raven deixou escapar, enquanto arranhava as costas do rapaz que um dia havia jurado proteger. Como fora parar ali, naquela cama? — Vou ser atirado no mais fundo poço do Inferno e lá vão me esquecer...

— Você é tão contraditório! — comentou Giovanni meio sem ar, ainda com o corpo unido ao de Raven. O orgasmo... fora ótimo. — Diz que não acredita em Deus, mas depois fala em Inferno...

Aquilo que a palavra “Inferno” designa pode ser muito mais do que um lugar no subterrâneo que arde em chamas e tem cheiro de enxofre, dominado por homens de chifres e tridentes malignos. Assim como existem formas e formas de se morrer. Posso matar qualquer um, mas ninguém pode me matar. Exceto você. Sinto que apenas você pode derramar meu sangue... e é isso o que acontecerá no final, tenho certeza.

— Nada disso jamais terá um final, Raven. Agora cala a boca e dorme.

Me perdoe.

— Não há nada a perdoar, Rae-Rae.

Prometo não fazer de novo; não me contive. Perdão.

— Tudo bem. Sério. Agora durma, por favor.

Giovanni?

— O que foi?

Os braços o apertaram mais um pouco. A boca estava contra seu ouvido.

Doeu muito quando eu fiz com você?

— Não.

Tem certeza?

— Certo, doeu muito. Doeu mais do que um ferimento de bala.

Eu sei como é...

— Eu machuquei você?

Já aguentei castigos piores. — Raven murmurou — Mas tenho que admitir que seu castigo é bem... grande.

Giovanni deu uma risada sem-graça, pois sabia exatamente do que ele estava falando. Raven, ainda sério, acariciou um pouco seus cabelos.

Isso não foi nada, ok? Não temos uma relação... desse jeito. Não posso ser o homem que você precisa.

— Você tem tudo o que eu preciso. E mais um pouco.

Não sou gay.

— Essa afirmação foi a coisa mais estúpida que você já disse.

Eu sei.

Giovanni acabou sorrindo.

Sinto por não poder te fazer feliz. Foi apenas instinto. Eu... queria proteger você. Ou talvez apenas me aliviar. Não sei. Não nutra esperanças. Acabe com esse sentimento. E vamos esquecer o que aconteceu aqui, garoto.

O sorriso sumiu.

Raven empurrou de cima dele, desencaixando-se com cuidado e fazendo uma última careta de dor. Ele levantou e dirigiu-se para o banheiro, pela segunda vez na vida, sêmen escorrendo pelas pernas. Mas dessa vez... até que não havia doído tanto.

Boa noite.

Encarando as costas pálidas do mais velho, o rapaz não respondeu.

A propósito... feliz aniversário, baixinho.

A porta do banheiro se fechou e ele ficou sozinho com os próprios pensamentos.

///

Giovanni levantou-se rapidamente ao ver Raven adentrar seu quarto, liberto (bem... na verdade, mais ou menos, pois ainda haviam algemas em suas mãos, mas a focinheira e as correntes nos pés haviam sumido).

Abraçou-o como se não o visse há anos.

— Está tudo bem?

— Tudo bem. — confirmou o homem, vazio. — Vamos embora agora.

— Pra onde? O que Moskov falou pra você?

Vou te contar tudo pelo caminho. Por enquanto, apenas me siga...

Como um bom menino, o hispânico caminhou ao lado do sujeito pálido, atento a tudo ao seu redor, principalmente aos guardas de olhares nem um pouco amistosos que os acompanhavam até a saída do lugar.

//-//

Seu demônio fracassado...

Você vai tentar concertar seu erros, mas sabe que é impossível obter perdão para sua alma imunda.

Pelo menos... busque perdão para a criança.

A criança... a criança merece pelo menos isso de você.

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